Aracruz celulose realiza intensa campanha de difamação aos povos Tupinikim e Guarani
No dia 11 de setembro a Fundação Nacional do Índio (Funai) enviou ao Ministério da Justiça documentos comprovando que áreas ocupadas pela empresa Aracruz Celulose, no município de Aracruz, no Espírito Santo, são território dos povos Tupinikim e Guarani e devem ser demarcadas.
A contar desta data, o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, tem 30 dias (até 12 de outubro), para assinar a portaria declaratória, corrigindo os limites da terra de 7 para 18 mil hectares. Ele também pode retornar o processo para a Funai, pedindo mais informações.
Os povos Tupinikim e Guarani esperam que o ministro cumpra a promessa feita em fevereiro e defina a situação da terra até o fim do ano. Enquanto isso, a Aracruz Celulose realiza uma intensa campanha de difamação contra os dois povos, acusando-os de serem falsos índios e incitando a população local contra os indígenas.
Em uma cartilha distribuída aos funcionários da empresa e em escolas da rede municipal, a Aracruz chama os Tupinikim e os Guarani de "supostos índios" e afirma que eles não são originários do estado, quando, na verdade, em 1610 eles receberam as terras (sesmaria), onde já viviam, da coroa portuguesa. Também foram dadas palestras em defesa da Aracruz Celulose nas escolas, desqualificando os costumes, a pintura, as músicas e as crenças dos dois povos.
Na página da Aracruz na internet, a empresa diz que os Tupinikim e os Guarani não são indígenas, porque vivem em casa de alvenaria, têm antena parabólica, etc. Sem autorização para uso da imagem, mostra uma foto do cacique Jaguareté e afirma que ele é um "suposto índio", porque sua pintura e cocar são tradicionais de outros povos.
No dia 15 de setembro, a Comissão de Caciques e Lideranças Tupinikim e Guarani, numa entrevista coletiva, rebateu as acusações da Aracruz Celulose: "A empresa não tem prerrogativa para apontar o dedo e dizer se somos índios ou não; ou se os quilombolas são quilombolas ou não. Ela nos acusa de cometer atos violentos, mas o que é violento? É a Polícia Federal tirar nosso sangue, como fez em 20 de janeiro quando nos expulsou da aldeia que reconstruímos e que a empresa destruiu para plantar eucalipto? Ou é nossa ação de cortar os eucaliptos? Nós estamos agindo porque o governo não se posiciona e não agiliza o andamento do processo de demarcação", disse o cacique Jaguareté, de Caieiras Velha, explicando também a derrubada de eucaliptos que os indígenas fizeram no início de setembro para pressionar a Funai a finalizar o parecer, que foi enviado ao ministro da justiça com 25 dias de atraso em relação ao prazo legal.
Além disso, uma entidade de empresas capixabas, da qual a Aracruz faz parte, publicou várias notas nos jornais de maior circulação no estado, acusando as entidades que apóiam a luta dos Tupinikim e dos Guarani: "Repúdio e indignação seguido de insegurança. Estes são os sentimentos gerados pelos atos criminosos dos índios e não-índios (integrantes do MST, CIMI, Rede Alerta conta o Deserto Verde, entre outras) contra o patrimônio da empresa Aracruz Celulose e a ordem pública. As ações bárbaras de desrespeito às decisões judiciais e contra o direito da propriedade têm se acumulado de forma impune." (A Gazeta, 14 de setembro 2006).
Em uma carta com a assinatura de diversas organizações, a Comissão de Caciques repudiou as ações da Aracruz: "A posição da Aracruz Celulose demonstra não só desrespeito com a história, com a memória e a cultura do povo capixaba, mas também que esta empresa não tem escrúpulos quando se trata de garantir seus interesses, às custas da miséria e da destruição dos povos tradicionais e do meio ambiente. Campanhas milionárias financiadas por esta empresa vêm escamoteando os impactos gerados pela monocultura de eucalipto no Brasil e expondo os povos tradicionais desta terra a humilhações inomináveis."
Denúncias de racismo
Várias entidades acionaram os Ministérios Públicos Estadual e Federal no Espírito Santo, denunciando as ações da Aracruz como racistas.
O Fórum de Entidades Negras, os indígenas Tupinikim e Guarani, antropólogos e historiadores denunciaram no Ministério Público Federal no Espírito Santo o teor da cartilha e a postura da Aracruz. As entidades classificam a cartilha como racista, discriminatória e hedionda. Também cobram providências contra esse tipo de ação da empresa, impedindo a difamação da comunidade indígena perante toda a sociedade brasileira. O Procurador André Pimentel Filho está analisando o processo.
O Centro de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos (CPDDH) e Conselho Estadual de Direitos Humanos de Aracruz protocolou, no dia 21 de setembro, no Ministério Público Estadual uma denúncia contra a Aracruz Celulose, o vereador Davi Gomes e as empresas que assinaram as placas (out-doors), por discriminação racial. Os promotores Clarissa Martins e Francisco Verdeão analisarão a denúncia.