Brigada do MST participa de caravana em homenagem ao zapatista Galeano
Neste sábado (24), a Caravana Justicia para el compa Galeano chegou no Caracol La Realidad - centro de organização política autônoma dos zapatistas, na selva fronteiriça de Chiapas (México) com a Guatemala -, para homenagear o zapatista José Luis Solís, mais conhecido como Galeano, assassinado no último dia 2 de maio.
Debaixo do sol e calor da Selva Lacandona, mais de três mil bases de apoio e insurgentes zapatistas e cerca de mil aderentes da 6° Declaración de la Selva Lacandona, militantes do MST, representantes dos povos originários do México e outras organizações nacionais e internacionais prestaram homenagem ao sargento Galeano, do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN).
Galeano foi violentamente assassinado numa emboscada preparada pela Central Independiente de Obreros Agrícolas y Campesinos Histórica (CIOAC-H), segundo as declarações dos insurgentes.
Na declaração do Subcomandante Insurgente Moisés, toda dor e raiva deve ser usada na luta contra o sistema capitalista e buscar a justiça, não a vingança. “Como organização, nós zapatistas não somos como eles, que assassinam e matam quem luta pelo povo do México. Não somos como esses paramilitares comprados”, ressaltou.
Desde 1994, quando insurge o EZLN em defesa dos territórios autônomos campesinos e indígenas, várias outras organizações do campo mexicano, sob interesses distintos, vem sendo estimuladas pelo Estado mexicano para fragmentar, desmobilizar e combater esses processos de resistência autônomos.
Entre a luz e a Sombra
A homenagem a Galeano começou ainda pela tarde do dia 24 e se encerrou na madrugada do dia 25 de maio. No caracol La Realidad, em frente a seis comandantes e comandantas do Comitê Revolucionário Indígena e o Subcomandante Insurgente Moisés, foram escutadas as “últimas palavras públicas” do Subcomandante Insurgente Marcos.
O principal porta-voz do EZLN anunciou que deixará a liderança do movimento guerrilheiro mexicano. Em um extenso comunicado publicado neste domingo (25), o líder zapatista afirmou que a partir de agora não responderá mais pelo nome de Marcos, e seu novo nome será "Galeano", e que por sua “voz não será mais falada a voz da EZLN".
Em suas palavras frisou que a guerra de resistência contra o neoliberalismo ocorre diariamente em todos rincões dos cinco continentes, em seus campos e montanhas, envolvendo diferentes povos em distintas geografias, em tempos, pautas e calendários.
“Era e é a nossa, como a de muitos e muitas de baixo, uma guerra pela humanidade e contra o neoliberalismo”, e seguiu o pronunciamento: “Contra a morte, nós demandamos a vida. Contra o silêncio, exigimos a palavra e o respeito. Contra o esquecimento, a memória. Contra a humilhação e o desprezo, a dignidade. Contra a opressão, a rebeldia. Contra a escravidão, a liberdade. Contra a imposição, a democracia. Contra o crime, a justiça.”
Na segunda metade do seu discurso, após referir a dor e a raiva por crimes cometidos pelo sistema capitalista contra vários companheiros e companheiras em diversos lugares do México e do mundo, o subcomandante Marcos assinalou uma mudança geracional no processo organizativo dos zapatistas que procura se desvincular da personificação de um único líder, como foi construído pela burguesia e os grandes meios de comunicação de massa, e fortalecer a auto-organização coletiva e horizontalidade dos zapatistas.
“Nos demos conta de que já havia uma geração que podia olhar-nos de frente, que podia escutar-nos e falar-nos sem esperar guia ou liderança, nem pretender submissão, nem seguimento. Marcos, o personagem, já não era necessário”, afirmou.
Nesses 20 anos, os zapatistas vêm trabalhando a autonomia de suas comunidades, a formação política e ideológica, e investindo em projetos na área da educação, saúde e cultura que possibilitaram a melhoria significativa da qualidade de vida nas comunidades indígenas campesinas. Nesse processo a juventude vem assumindo um papel fundamental na continuidade da construção do poder autônomo, defesa dos valores e da luta zapatista.
“Espero que não te vá compa Galeano”, dizia o silêncio zapatista entre a dor e a raiva, entre gritos e sussurros.
"Pensamos que é necessário que um de nós morra para que Galeano viva. E para que essa impertinente que é a morte fique satisfeita, no lugar de Galeano colocamos outro nome para que Galeano viva e que a morte leve não uma vida, senão um nome somente, umas letras vazias de todo sentido, sem história própria, sem vida. Assim que decidimos que Marcos deixe de existir hoje.”
“Dito todo o anterior, sendo as 02:08 do dia 25 de maio de 2014 na frente de combate sul oriental do EZLN, declaro que deixa de existir o conhecido como Subcomandante Insurgente Marcos, o autodenominado “subcomandante de aço inoxidável”. Isso é, por minha voz já não falará a voz do Exército Zapatista de Libertação Nacional.”
Neste momento o subcomandante se retirou e na sequência uma voz soou ao fundo: “Tenham boa madrugada companheiras e companheiros. Meu nome é Galeano, Subcomandante Insurgente Galeano.”
Pairou o silêncio. Ouviu-se apenas o som da chuva caindo e um espectro de incertezas permaneceu no ambiente. Haviam pessoas emocionadas, outras surpresas e inúmeros comentários rompiam o silêncio procurando entender o ocorrido desta madrugada. Apagadas as luzes, a certeza de continuidade foi entoada nos gritos de ordem.
“Galeano vive! A luta segue!”
“EZLN! Não estão sozinhos!”
Da Página do MST, 26 de maio de 2014
http://www.mst.org.br/node/16155