Cumbre de los Pueblos - Plenária 2: Soluções reais e novos paradigmas dos povos
A defesa dos bens comuns passa pela garantia de uma série de direitos socioambientais, passa pelo fortalecimento da justiça ambiental e climática, pela solidariedade entre os povos e pelo respeito à cosmovisão das diferentes populações e pela defesa do Bem Viver (Buen Vivir) como forma de viver em harmonia com a natureza.
Durante a plenária, foram expressos vários direitos e propostas de soluções dos povos que devem ser asseguradas e promovidas como forma a defender os bens comuns e lutar contra a mercantilização e financeirização da vida e da natureza. O primeiro grande bloco é o direito a terra e ao território, expresso por meio de diversas lutas em defesa do ordenamento territorial e por uma regularização fundiária com a participação ativa dos povos, que tem como importante instrumento a Cartografia Social para que as comunidades possam ter controle de seu território; pela Reforma Agrária, promoção da Soberania Alimentar e da Agroecologia; pela criação de políticas públicas estruturantes para fortalecimento dos sistemas de tecnologias sociais e sustentáveis construídas pelos povos; pela proteção ao conhecimento tradicional e pelo combate à biopirataria; pela defesa da pesca artesanal; pela promoção das lutas locais contra os megaprojetos, em especial contra as grandes barragens e as indústrias extrativas do qual saíram propostas de aprovação de uma moratória aos empreendimentos de mineração; pela não exploração das areias betuminosas (tar sands) e pela garantia da integridade das áreas naturais prioritárias no mundo como forma a defender os direitos da natureza; a existência obrigatória de consultas prévias e informadas, com mecanismos de participação direta das comunidades em áreas de desenvolvimento urbano e rural, que garanta a participação e decisão pública, inclusive o direito a dizer não a um determinado projeto; bem como e a extensão da Convenção 169 da OIT para outros povos tradicionais.
Outro bloco de direitos diz respeito ao direito a cidade como forma de acessar os bens comuns da cidade, tais como os espaços públicos e a cultura. A gestão democrática dos espaços públicos com ampla participação popular deve caminhar em oposição à mercantilização dos mesmos e da declaração das cidades como espaços e territórios livres. A luta pelo direito a cidade deve também passar pela oposição ao processo de militarização que vêm ocorrendo nas mesmas, pelo direito à moradia digna e ocupação das moradias vazias frutos da especulação, além do desenvolvimento e fortalecimento de iniciativas que buscam a transição para um novo modelo de cidade que incluem, entre outras, o consumo consciente que promova a economia solidária e feminista, as hortas urbanas, a agroecologia urbana, a bioconstrução e a permacultura.
O direito à água, seja no campo ou na cidade, é um pilar fundamental nesse sentido e deve ser assegurado também por meio de um manejo público e comunitário dos recursos hídricos. Assim como o direito à saúde como serviço público gratuito e de qualidade e o direito à educação por meio de um ensino público forte, de qualidade e quantidade para, atender as demandas da população, e não privatizado.
O direito à cultura, à comunicação e à liberdade de expressão, deve se basear na ressignificação do papel da cultura, através da democratização e do respeito às diferenças e a diversidade cultural. Passa pela valorização e visibilização dos modos de vida das comunidades tradicionais, e pela autodeterminação dos povos, direito à memória e à identidade. A não criminalização dos movimentos sociais e das populações é uma importante dimensão que deve ser assegurada. Nesse sentido, as nossas soluções passam pelo fortalecimento das redes de comunicação entre organizações, movimentos sociais e povos, bem como a defesa e ampliação do uso das ferramentas construídas pelos mesmos como, por exemplo, as rádios comunitárias.
O direito ao não endividamento, por meio da não aquisição de novas dívidas e não pagamento das dívidas cobradas ilegitimamente, pela extensão do controle dos bancos públicos e privados, e pelas auditorias integrais das dívidas em todos os países, com ampla participação e decisão pública e observância dos princípios de justiça fiscal. Exigir mais eficiência e transparência no uso dos recursos financeiros dos bancos públicos é fundamental, bem como inverter a ótica de financiamento, extinguindo a utilização de recursos públicos para grandes projetos que irão causar mais injustiças ambientais. Este direito também passa pela reparação, na qual os países do Norte têm que pagar pelo uso dos recursos naturais explorados historicamente no Sul e tem como eixo fundamental o decrescimento econômico dos países do Norte. Por fim, nossas soluções também passam pela abolição de todos os mecanismos de financeirização dos bens comuns, da regulação do atual sistema financeiro internacional que avance na criação de um sistema financeiro alternativo, baseado na economia ecológica e na redistribuição de riquezas.
Demandamos também a ratificação do Protocolo de Nagoya Kuala Lumpur do protocolo de Cartagena, em defesa da biodiversidade, da soberanía dos povos para que os países de todo o mundo erga um marco jurídico capaz de responsabilizar as empresas transnacionais da biotecnologia por danos gerados por trangênicos ao meio ambiente e a saúde das populações.
São muitas as soluções que vêm sendo desenvolvidas pelos povos. Para que estas possam ser ampliadas e fortalecidas é essencial contar com políticas públicas estruturantes e fundos de apoios a projetos socioambientais para as comunidades locais, assim como a gestão e financiamento público com transparência e controle social de todas as políticas sociais, bem como a reversão de todos os processos de privatização destas políticas.
Para tanto devemos buscar uma nova relação entre os movimentos urbanos e rurais, ampliando a solidariedade entre eles, uma vez que o sistema utiliza de mecanismos semelhantes para expropriar os povos de suas terras e territórios. Assim, processos de resistência coletivos são parte das nossas soluções.
Por fim, precisamos manter e expandir a defesa dos bens comuns que hoje já é feita pelas populações originárias - que os chamam de “o sagrado” -, e construir um acordo mundial entre países e populações que possam defender os bens comuns como algo não mercantilizável. Pensar numa Economia dos Comuns, através de um processo construído de baixo para cima a partir das experiências locais é vital para os povos retomarem a decisão sobre seu futuro e sua economia.