Denúncias enviadas à ONU sobre a criminalização e violação de direitos humanos

2008-07-25 00:00:00

Doze organizações da sociedade civil brasileira (Terra de Direitos, Justiça Global, Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, AATR, Mariana Criola, GAJOP, Dignitatis, MST, INESC, FASE, Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos e COHRE) enviaram duas denúncias, nessa segunda-feira (21), a Organização das Nações Unidas (ONU) para relatar a criminalização dos movimentos sociais e a parcialidade do Ministério Público gaúcho ao decidir pela dissolução do MST.

As denúncias foram encaminhadas a Relatores Especiais da ONU, que a partir dos documentos irão elaborar recomendações ao Brasil, país que assumiu internacionalmente o compromisso de defender e promover os direitos humanos civis, políticos, sociais, culturais e ambientais.

As denúncias foram encaminhadas ao Relator sobre Independência dos Juízes e Advogados, Leandro Despouy e à representante Especial dos Defensores de Direitos Humanos da ONU, Margaret Sekaggya, já que as ações praticadas pelo Ministério Público contra o MST, segundo os promotores do Rio Grande do Sul, objetivando “proteger a legalidade e o Estado Democrático de Direito” estão na verdade violando direitos humanos fundamentais, agindo contra pactos e tratados internacionais e a própria Constituição Federal brasileira.

Resumo – Relatoria Direitos Humanos ONU

Em 25 de junho de 2007, o Conselho Superior do Ministério Público do estado do Rio Grande do Sul instaurou o procedimento administrativo n.º 16315-0900/07-9 para “levantamento de dados sobre as atividades do MST no estado a fim de adotar providências na área de atuação do órgão.” Em três de dezembro de 2007, o Conselho aprovou por unanimidade, em Ata no 1.116, o relatório do conselheiro Gilberto Thums, referente à investigações sobre o MST e decidiram, em caráter confidencial, promover Ação Civil Pública com o objetivo de dissolver o MST e declarar a sua ilegalidade.

No mesmo documento ainda constam outras ações a serem promovidas pelo Ministério Público contra o MST: tomada de medidas cabíveis “com vista à suspensão das marchas, colunas ou outros deslocamentos em massa de sem-terras”, para investigar os integrantes de acampamento e a direção do MST pela prática de crime organizado e utilização de verbas públicas; Intervenção do Ministério Público em escolas dos acampamentos do MST; impedir a presença de crianças e adolescentes em acampamentos, assim como em marchas; desativação dos acampamentos situados nas proximidades da Fazenda Coqueiros; investigação eleitoral nas localidades em que se situam os acampamentos controlados pelo MST, formulação de uma política oficial do Ministério Público, com a finalidade de “proteção da legalidade no campo”.

Para dar cumprimento às ações acima em junho de 2008, foram ajuizadas ações civis públicas contra o MST, utilizando inclusive a Lei de Segurança Nacional (promulgada na época da Ditadura Militar).

As ações do Ministério Público, tendentes a formular uma política oficial do órgão, começaram em janeiro de 2008, iniciando o processo de criminalização e de violações de direitos humanos contra todas as famílias assentadas e acampadas. Observou-se isto no Encontro Estadual do MST no Rio Grande do Sul, janeiro de 2008; Jornada de Lutas das Mulheres Sem Terra, março de 2008; ação da Brigada Militar em um acampamento de trabalhadores rurais no município de São Gabriel (Relatado pelo Deputado Adão Pretto), Maio de 2008; Destruição de um acampamento no município de Viamão, junho de 2008; e expulsão das famílias em dois acampamentos, no município de Coqueiros do Sul, junho de 2008;

O Ministério Público ao praticar as ações contra o MST objetivando “proteger a legalidade e o Estado Democrático de Direito” estão sendo os maiores violadores dos direitos humanos fundamentais agindo contra pactos e tratados internacionais e a própria Constituição Federal brasileira, num verdadeiro desvio de finalidade do órgão.

Os fatos narrados comprovam as violações de direitos humanos contra as famílias de trabalhadores rurais sem terra, a criminalização do MST e a ameaça à democracia e ao próprio Estado Democrático de Direito e as organizações brasileiras entendem ser importante a apreciação pela Relatoria da ONU sobre as denúncias apresentadas, com a tomada de providências.

Denúncia Relator sobre Independência dos Juízes e Advogados

As ações dos órgãos judiciários pretendem atingir o MST e caracterizá-lo como uma organização criminosa, agredindo frontalmente o direito à vida, à integridade física, à liberdade pessoal, liberdade de associação, direito à circulação, liberdade de reunião dos trabalhadores rurais sem terra do Estado do Rio Grande do Sul, configurando violações sistemáticas de direitos assegurados pela Constituição Brasileira e pelos Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil, além de retomar práticas da ditadura militar.

Os objetivos do procedimento administrativo, abertos pelo Conselho Superior do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, seriam “levantar informações sobre os acampamentos do MST e adotar providências cabíveis na esfera de atuação do Ministério Público Estadual”. Neste procedimento administrativo, dois membros do Ministério Público, investigaram durante 06 meses fatos relacionados à questão agrária do Estado do Rio Grande do Sul. Além de tomarem depoimento de inimigos históricos da Reforma Agrária, como coronéis da Brigada Militar, grandes proprietários rurais, utilizaram textos de caráter fortemente ideológico e contrário à atuação dos movimentos sociais do Brasil.

O Conselho Superior do Ministério Público designou o procurador Gilberto Thuns para relatar o procedimento administrativo caracterizando o MST como “organização criminosa”, comparada ao tráfico de drogas e que busca constituir um “estado paralelo”.

Na data de três de dezembro de 2007, o Conselho Superior do Ministério Público aprovou o relatório do conselheiro Gilberto Thuns, buscando promover uma ação civil pública com vistas à dissolução do MST e declaração de sua ilegalidade. Além destas, propunham a tomada de medidas cabíveis “com vista à suspensão das marchas, colunas ou outros deslocamentos em massa de sem-terras”, para investigar os integrantes de acampamento e a direção do MST pela prática de crime organizado e utilização de verbas públicas; Intervenção do Ministério Público em escolas dos acampamentos do MST; impedir a presença de crianças e adolescentes em acampamentos, assim como em marchas; desativação dos acampamentos situados nas proximidades da Fazenda Coqueiros; investigação eleitoral nas localidades em que se situam os acampamentos controlados pelo MST, formulação de uma política oficial do Ministério Público, com a finalidade de “proteção da legalidade no campo”.

Fica claro, pela leitura da Ata no 1.116, onde foi aprovado o relatório do conselheiro Gilberto Thums, que o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, estruturou um verdadeiro plano de ação parcial para criminalizar e impedir a luta pela terra no Estado do Rio Grande do Sul, atingindo, de forma indiscriminada milhares de famílias de trabalhadores sem terra.

Além do repúdio a esta ação do Ministério Público explicitado pelo Ministro da Justiça, Tarso Genro, sobre o conteúdo da mencionada Ata, o procurador para Assuntos Institucionais Eduardo de Lima Veiga, ressaltando a ilegalidade da conduta, disse que “O Conselho sequer tem poder para determinar tais acusações, que nem são consensuais. Serão mantidas no documento apenas as medidas protetivas para evitar que o Rio Grande do Sul protagonize um novo Eldorado do Carajás.” Certo é que, não cabe ao Conselho Superior, órgão colegiado, determinar as medidas cabíveis ante as conclusões de um procedimento investigativo, mas sim, ao promotor de justiça competente para propor a Ação Civil Pública.

Apesar disso, a partir da determinação do Conselho, 04 Ações Civis Públicas (disciplinada pela lei 7.347/85 e deve ser proposta para tutela dos interesses difusos e coletivos) foram propostas em diferentes cidades do estado do Rio Grande do Sul (01 São Gabriel, 01 Carazinho e 02 Canoas). Todas em flagrante desrespeito a direitos fundamentais como a liberdade de associação, o direito à moradia, à integridade física e à liberdade de locomoção.

As ações repetem o conteúdo produzido no procedimento administrativo conduzido pelo Ministério Público e, notadamente as referentes à citações de textos de autores que criticam a atuação dos movimentos sociais no Brasil e em particular, do MST, o caracterizando como uma organização criminosa.

Diante da gravidade dos fatos narrados, das violações de direitos humanos contra as famílias de trabalhadores rurais sem terra, a criminalização do MST e à ameaça à democracia e ao próprio Estado Democrático de Direito, as organizações brasilieras enviaram a denúncia para a Relatoria da ONU, a fim de que sejam tomadas as providências descritas na Resolução 1994/41, da Comissão de Direitos Humanos.