Indígenas sofreram repressão da igreja e do governo no Canadá

2006-03-10 00:00:00

Essa é a terceira vez que começo a contar a história de Tswiyuleew. Exemplos de vida como o dado por essa indígena canadense são realmente difíceis de resumir em poucas palavras.

Tswiyuleew, ou Dawn Morisson, seu nome inglês, representa um povo que foi quase extinto pela força e pela inserção da cultura hegemônica em sua vida cotidiana. Na primeira metade do século 20, a geração de sua mãe foi arrancada de suas tribos e enviada a internatos quando ainda eram crianças.

O assunto emociona Tswiyuleew. "Eu já conheço as histórias, mas ainda há algumas que não consigo ouvir sem ficar muito emotiva", disse. A ação contra as crianças foi realizada pela igreja católica com o aval do governo da época. "Elas apanharam e foram estupradas nas escolas. Isso abalou as estruturas familiares e das comunidades", relatou.

Como a língua e a cultura ensinadas nos internatos se restringiam à inglesa, transportada para o Canadá, as crianças não assimilaram a história de seu povo. O resultado do impacto dessa ação política pode ser visto hoje em números: mais de 50% dos indígenas foram retirados de sua terra e vivem nas cidades. Em todo o país eles chegam a 180 mil pessoas. Até 10 anos atrás, Tswiyuleew morava em Vancouver.

"Cresci longe da tribo, mas sempre mantive conexão com a terra. Estudei sobre as plantas e a agricultura e assim as minhas raízes indígenas permaneceram vivas". Ela era professora de ciências e matemáticas quando decidiu largar a universidade e voltar para a reserva florestal em que vivem as comunidades de seus ancestrais. "Eu ensinava a meus alunos apenas a perspectiva ocidental do mundo. Os indígenas têm problemas em se identificar como cientistas e ter autonomia porque há muito autoritarismo".

Tswiyuleew diz que voltou à tribo com a intenção de ajudar a trabalhar as questões ambientais e sociais. Atualmente estuda a história oral e os valores de seu povo. Um de seus irmãos também fez a opção de morar na reserva, chamada Seewepemculeew, porém o restante de sua família permanece nos centros urbanos.

"Em Vancouver há uma forma de segregação disfarçada. O racismo no Canadá é sistêmico e por mais bem intencionadas que as pessoas sejam, não percebem que podem oprimir", analisou.

Organização

A caça e a agricultura têm papéis fundamentais na sobrevivência diária desses povos. Mas para além do trabalho interno, eles também se preocupam com sua organização no Canadá e no mundo. O Grande Chefe George Manuel, líder já falecido da tribo, foi um dos responsáveis pela fundação do Conselho Mundial de Indígenas.

Essa é a primeira vez que Tswiyuleew sai para representar o movimento indígena fora de seu país. Pergunto qual é sua avaliação do Fórum Terra, Território e Dignidade e seus olhos transmitem a mesma emoção do que quando falou sobre as crianças e sua mãe. "É esse o sentimento que me faz continuar, que me motiva".