Lições do Grito e do Plebiscito (Brasil)
O processo do Grito dos Excluídos e do Plebiscito da Dívida Externa foi
iniciado já há alguns anos, quando as pastorais sociais, juntamente com
outros movimentos sociais iniciaram as semanas sociais brasileiras. A
primeira, em 1991, teve como tema: Mundo do Trabalho, Desafios e
Perspectivas. Já a segunda, realizada de 1993 a 94 refletiu sobre: Brasil -
Alternativas e Protagonistas. Desde então participavam o Movimento Sem Terra,
Central dos Movimentos Populares, a Central única dos Trabalhadores, o
Conselho Nacional da Igreja Cristãs e a Coordenadoria Ecumênica de Serviços.
A parceria vem se concretizando já há diversos anos, ou melhor, há quase uma
década. É um movimento não só ecumênico, mas pluralista e democrático, onde
os envolvidos assumiram uma causa comum.
No final da Segunda Semana Social Brasileira, na avaliação as pastorais,
perguntavam-se como poderíamos manter a articulação e as parcerias que já
estavam bastante consolidadas. Alguém sugeriu que realizássemos o Grito dos
excluídos. Em 1995 tivemos o primeiro, com o tema, a vida em primeiro lugar.
De 1997 a 2000 realizamos a 3a Semana Social Brasileira, com o tema:
"Resgate das Dívidas sociais, Justiça e Solidariedade na Construção de uma
Sociedade Democrática". A fundamentação desta está em Levítico 25. Na
celebração de Jubileu, realizado há cada 50 anos, uma das atividades
concretas era o perdão das dívidas. Já em 1994 o Papa João Paulo II escreveu
a Carta Apostólica "Tertio Millenio Adveniente" e, no número 51, ele diz que
na vidrada do milênio seria conveniente pensar no perdão das dívidas que
pesam sobre os ombros dos países pobres. A partir de então ganhou força a
Campanha Jubileu 2000. No Brasil ela se concretizou através do Simpósio e do
Tribunal da Dívida Externa, realizados em 1998 e 1999, respectivamente. Neste
processo damo-nos conta de que as dívidas sociais tinham raízes históricas e
culturais como a dominação política e cultural e a escravidão. Percebemos
também que há raízes atuais que aprofundam as dívidas sociais. A dívida
externa apareceu como sendo a principal raiz do atual agravamento das dívidas
sociais. Daí surgiu a proposta do Plebiscito para suscitar a discussão sobre
a dívida e exigir uma auditoria da mesma.
De início, o governo tentou ignorar o assunto, depois, através do Ministro
Malan, tentou desqualificá-lo buscando partidarizá-lo, fingindo de não saber
que na organização estava a CNBB, o CONIC, o MST, a CMP, enfim uma vasta gama
de organizações socais. Só que a crítica do ministro serviu para esquentar
ainda mais a discussão sobre a dívida externa. De modo que, um dos objetivos
que era o de suscitar a discussão sobre a temática, em nossa avaliação foi
atingido. Diante da repercussão que o Plebiscito provocou, através dos 5,5
milhões, articulado com o Grito que se realizou em 1700 locais, colocando nas
ruas um milhão e trezentas mil pessoas, o governo não pôde mais ignorar os
fatos. Todo o processo do Plebiscito que desencadeou um movimento unificado e
articulado, tinha um único objetivo e foi realizado pelo povo brasileiro. Foi
um verdadeiro mutirão; um exercício se superação de certas visões e atitudes
departamentalizadas. Prevaleceu o protagonismo popular, porque se envolveram
entidades, trabalhadores urbanos e rurais, estudantes, sindicatos e
professores, advogados, juristas, jornalistas, diversas igrejas, comunidades
e paróquias, trabalhadores da saúde, câmaras municipais, políticos,
economistas, crianças, jovens, mulheres, negros e índios.
Tanto o Plebiscito como o Grito questionam profundamente o governo e FHC e
sua política de exclusão, de submissão ao FMI e ao capital internacional, que
aumenta o desemprego e as desigualdades. Trata-se de mudar de rumo no sentido
de priorizar o resgate das dívidas sociais e discutir com toda a nação o
problema do endividamento. Enfim, é necessário dizer não a atual política
neoliberal e construir a nossa própria soberania. Será muito difícil ao
governo continuar insensível ao clamor do povo diante da expressiva votação
de mais de 5,5 milhões de votos sendo que mais de 90% disserem não ao FMI e
às dívidas externa e interna.
O Plebiscito vai continuar exigindo que o Congresso Nacional aprove a
proposta de convocação de um Plebiscito Oficial, que definirá, com a
soberania popular, a política de endividamento que o nosso país deverá seguir
e exigir uma Auditoria Pública da Dívida Externa e Interna com a participação
das entidades que organizaram o Plebiscito.
O Grito aponta para a necessidade de continuar reforçando o Calendário Comum
de Mobilizações como têm acontecido nos últimos anos. Inclusive no aspecto
internacional aprofundando a ligação com a Campanha Jubileu 2000, com a
Marcha Mundial das Mulheres, com a luta pelos direitos dos imigrantes através
da Coalizão dos Imigrantes Indocumentados nos Estados Unidos, apoiando a luta
contra o racismo e a xenofobia e principalmente com o Grito dos Excluídos/as
Continental - 2000 - Por Trabalho, Justiça e Vida, a se realizar em Nova
Iorque, no dia 12 de outubro, além dos demais países das Américas. Como
objetivos o Grito Continental denuncia o modelo neoliberal excludente e
perverso; luta contra a exclusão social; fortalece a soberania dos povos e a
defesa da vida; busca resgatar as dívidas sociais; luta contra o pagamento da
dívida externa e se opõe a OMC e a ALCA.
* Pe. Luiz Bassegio
Secretário do Gritos dos Excluídos/as Continental.