Livrai-nos do “bem”

2002-09-10 00:00:00

O império norte-americano, através de Bush, quer dominar o Continente
Americano e o Caribe de todas as formas possíveis: política, econômica e
militarmente. Para isso usa toda espécie de chantagem que está ao seu
alcance, como fez no ano passado, por ocasião dos atentados de Nova
Iorque.

Não esqueçamos a infeliz frase do presidente Bush, quando dos
acontecimentos de onze de setembro do ano passado. “Agora é a luta do
‘bem’ contra o mal, quem não está a nosso favor está com os terroristas”.
Considero que esta é uma frase de uma insanidade monumental. Bush, eu
não estou nem com os terroristas e nem com o senhor, muito menos com sua
política imperialista que quer submeter os países das Américas e do
Caribe ao seu domínio. Nem por isto me considero terrorista. O mesmo
poderiam dizer milhões de empobrecidos pela política que os EUA e o FMI
impõem aos países do Continente americano. Creio ser importante ter
memória história justamente neste período em que inúmeros países estão
engajados no Plebiscito sobre a ALCA.

É necessário que nos perguntemos se, o país que através de seu governo,
mais matou gente nos últimas dezenas de anos (Hiroshima, Nagasaki,
Vietnam, apoio às ditaduras militares na América Latina, Afeganistão e
uma possível nova e anunciada invasão do Iraque e apoio a Israel contra
os palestinos); o país que mais produz e vende armas; o país que implanta
bases militares onde bem entende e que quer agora implantar um “tratado”
de mão única e sequer respeita ou assina os tratados internacionais em
favor da humanidade, do meio ambiente e do planeta, este país, representa
o bem?

Império que além de nos dominar econômica, comercial e politicamente,
quer nos dominar por meio de seus planos e militarmente através de
inúmeras bases militares espalhadas em pontos estratégicos, pode ser
chamado de “bem”. Senão vejamos.

No encontro com o acampamento de jovens, na República Dominicana, falando
do Plebiscito e do Grito, tive oportunidade de falar com jovens de Porto
Rico. Disseram-me que os Estados Unidos tem 23 bases militares naquele
país. Perguntei se não temiam que o peso das mesmas poderia afundar o
país no meio das águas! Qual não foi minha surpresa diante da resposta
deles: “Se Porto Rico afundar, algumas das bases não afundarão, pois
estão preparadas também para isto”.

Não podemos esquecer das outras, Manta no Equador; Guantanamo em Cuba;
Plano Colômbia e Plano Puebla Panamá e Alcântara fazem parte da mesma
estratégia. Elas são o braço militar do domínio comercial na região.

É neste contesto que se realiza o Plebiscito sobre a ALCA nos países das
Américas e do Caribe. No caso do Brasil, o Plebiscito exige, além de
elevar o nível de consciência do povo, organizar a população, discutir um
projeto popular e barrar a ALCA, que o governo organize um Plebiscito
oficial a fim de que o nosso povo decida se quer ou não a ALCA.
Independentemente do que pense Bush a respeito daqueles que se opõe à sua
sede imperialista de dominação e exploração.

Os bispos do Canadá, em recente documento, nos alertam sobre o perigo que
representa a ALCA: "Do modo como está pensada, a ALCA afeta a condição
soberana dos Estados, traz prejuízos ao meio ambiente e dificulta a
participação democrática do povo nos atos do governo... Quem observa com
preocupação o processo da ALCA, o descreve como o tratado de comércio e
de investimentos mais avassalador da história. Sérios indícios deixam
entrever de que forma o comércio e os investimentos poderiam se desligar
de qualquer forma de controle da cidadania e da autoridade dos governos
legitimamente eleitos, deixando às corporações transnacionais e aos
tribunais comerciais o poder de operar de forma independente e
secreta...O objetivo primordial do capítulo 11 (transposto do NAFTA, para
a ALCA) foi o de limitar a capacidade dos governos de proteger o meio
ambiente, a saúde e outros valores públicos, diante dos interesses
comerciais”. (Vendendo o Futuro – Documento dos Bispos Católicos do
Canadá – Comissão de Assuntos Sociais).

A CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – através do documento
67, também nos alerta sobre esta ameaça: “ A potência hoje hegemônica no
mundo vem pressionando nosso país a aderir ao projeto da ALCA – Área de
Livre Comércio das Américas – que ameaça aumentar a submissão do Brasil e
de toda a América Latina aos interesses da economia dos EUA.” (doc. 67 –
Eleições 2002).

Outro exemplo de ameaça à nossa soberania, é o recente acordo Brasil/EUA
sobre a Base para lançamento de foguetes em Alcântara, no Estado do
Maranhão.Vejamos alguns artigos já assinados pelo presidente FHC: “ O
governo brasileiro não poderá usar os recursos provindos do uso da Base
de Alcântara em programas de desenvolvimento tecnológico de uso de
foguetes ou veículos aéreos; O Governo dos EUA poderá adotar
unilateralmente medidas que prevaleçam sobre os termos do acordo (art. 3)
; O acesso aos veículos de lançamento estacionados na base será
controlado 24 horas por dia, pelas autoridades norte-americanas e a
entrada só será permitida a pessoas portadoras de crachá fornecido por
essas autoridades (Art 4); Inspetores norte-americanos poderão realizar
inspeções sem aviso prévio às autoridades brasileiras (art.6); A
Alfândega brasileira será proibida de revistar e inspecionar qualquer
remessa de material norte-americano à base de Alcântara (art.8); O
governo brasileiro deverá recuperar imediatamente os escombros dos
foguetes caídos no mar ou em seu território e entregá-los ao governo
americano sem fotografá-los ou estudá-los (art.8).

Diante de tudo isso, é mais do que necessária a orientação do documento
67 da CNBB, onde os bispos do Brasil advertem: “Neste novo contexto
mundial, visualiza-se a necessidade de nosso país definir um projeto
nacional próprio”.

É importante reforçar iniciativas que mobilizem a sociedade civil a tomar
consciência da realidade e lutar por sua soberania, como o Plebiscito
sobre a ALCA, ocorrido no Brasil, entre os dias 1 a 7 de setembro, e a
Campanha Continental Contra a ALCA nos países do continente americano.

* Padre Luiz Bassegio, é secretário do Grito dos Excluídos/as Continental
e membro da coordenação continental da Campanha contra a ALCA.