Fórum deve avançar para as ações

2006-02-02 00:00:00

Para o guatemalteco Juan Tiney, da Via Campesina, é importante que o
Fórum afine ações contra as políticas imperialistas e neoliberais, que
estão cada vez mais fortes.

Brasil de Fato – Qual é a importância do FSM para a Via Campesina?

Juan Tiney – Tanto para a Via Campesina quanto para a Cloc a
prioridade é encontrar aqui diferentes organizações do mundo para
compartilhar nossa realidade. Há uma ofensiva muito intensa do
neoliberalismo contra o nosso povo. Portanto, temos que seguir
discutindo mas, sobretudo, tomando ações em diversos temas, como a
agricultura, a soberania alimentar, a mercantilização dos nossos
recursos naturais sem nosso consentimento ou participação. Até porque
não estamos interessados em ter participação já que não queremos
vender nenhum pedaço dos nossos recursos naturais. Sendo assim, a
privatização destes elementos é um roubo. Por isso, é importante que,
para a Via Campesina, esse Fórum afine as ações que vamos tomar daqui
adiante, uma vez que as políticas como as da Organização Mundial do
Comércio (OMC) e os Tratados de Livre Comércio (TLCs) e a Área de
Livre Comércio das Américas (Alca) estão cada vez mais fortes. O
imperialismo e as transnacionais estadunidenses e européias também.
São necessárias ações claras e decididas. Mas, desde já, o Fórum é um
momento de articular alianças com outros setores para que, em conjunto,
tomemos essas ações. Se isso não ocorrer, seguirão nos ameaçando,
desprestigiando nossos movimentos e encarcerando nossos líderes.

BF – Quais seriam essas ações?

Tiney – No dia 17 de abril, Dia Internacional da Luta Camponesa,
faremos algo claro e imediato frente ao que está acontecendo. Caracas
deve ser ponto de partida para essa ação. Assim, nessa data faremos
ocupações de terra e muitas outras manifestações em defesa da
soberania alimentar. Mesmo porque, os dois temas estão conectados.
Garantir a soberania alimentar não é nada mais que impulsionar a
reforma agrária pois primeiro é necessário produzir os alimentos do
povo, não permitir que em nossas fronteiras continuem entrando
produtos transgênicos. Senão teremos a terra, mas não os meios. O tema
da reforma agrária implica ocupação de terra, implica produção,
tecnologia, participação de todo o povo, comercvialização e
conscientização, principalmente, nas cidades onde as pessoas já
consomem produtos transgênicos, sem saber que produzimos alimentos
saudáveis. No resto do ano, haverá outras mobilizações mas desse dia é
de onde deve sair a força, a articulação e a coordenação.

BF – Mas, nesse momento, também é importante preocupar-se em fazer
protestos?

Tiney – Claro. O Fórum deve ser também um espaço de denúncia porque
coisas graves estão acontecendo em diversas línguas e o Fórum deve se
constituir como uma única voz dos diferentes povos. De modo que a
solideriedade, a unidade e a aliança concretizem-se. Essa luta deve
ser dos povos de diferentes partes do mundo mas não pode ser separada.
Precisamos ser o mais uníssono possível para que o imperialismo escute.
Portanto, não estamos dispostos a continuar sendo criminalizados. Nós
somos as vítimas e não é a primeira vez que encarceram e assassinam
nossos líderes.

BF – Quais exemplos de denúncias o senhor poderia citar?

Tiney – No caso da América Central há uma imposição dos Tratados de
Livre Comércio (TLCs) e já podemos observar os impactos que isso está
produzindo em nosso povo. Por outro lado, tem a repressão contra os
povos indígenas da Guatemala. As empresas pretroleiras e mineiras
estão se metendo maciçamente em nossa comunidade. Isso também acontece
na Colômbia, no Equador, etc.. No Chile, as mulheres são vítimas dos
agrotóxicos. Há muito que denunciar mas também precisamos discutir
vitórias e avanços, como o caso da Colômbia onde um Tribunal proibiu o
presidente da República (Alvaro Uribe) de assinar um TLC. Escutaremos
muito mais êxitos porque não apenas sofremos repressão, como também
recebemos triunfos.

BF – Por ser em Caracas, o que o senhor espera deste Fórum?

Tiney – Estamos vivenciando o calor revolucionário das venezuelanas e
dos venezuelanos. Já se vê o entusiasmo das pessoas nas ruas. Já se
iluminam os rostos. Já se nota um crescimento da aceitação do povo
para com as tarefas revolucionárias. Estamos observando vários avanços
tecnológicos. Vemos também a entrega do poder ao povo, ou seja, saúde,
educação, moradia. E esperamos ter a oportunidade de ir para algumas
províncias para ver mais de perto. Todos nós do 6º FSM temos um
compromisso de escutar esse ator, esse povo, anteriormente
discriminado, e agora protagonista dessa revolução socialista. Podemos
observar muitas coisas que não se vêem em nossos países ou que se
ocultam. Escutamos a CNN, as informações da grande imprensa em nossos
países e aqui vemos uma realidade totalmente diferente.

BF – O que significa o crescimento dos governos de esquerda na América
Latina?

Tiney – Além dos venezuelanos, é importante que a mensagem do Fórum
seja de solidariedade com o povo da Bolívia e com todos os governos e
movimentos democráticos e revolucionários do mundo. Mesmo porque
precisamos marcar um caminho para seguir e completá-lo. Assim, o
movimento indígena e camponês da América deve sair fortalecido. Se em
outras ocasiões dispersamos nossas forças atendendo outros aspectos,
perdemos a oportunidade de colocar em primeira ordem o que se passa no
campo, na agricultura e com o nosso povo porque é lá que está a
essência da vida para todos.

Estamos vivendo um momento de crescimento da esquerda que vem dos
movimentos sociais porque, se há fortalecimento da esquerda, isso é
produto das mobilizações que estão se tornando muito mais massivas.