Contra censura, democracia nas comunicações
Porto Alegre – Antes mesmo da abertura oficial do quinto Fórum Social Mundial (FSM), cerca de 300 ativistas e jornalistas já ocupavam o espaço reservado aos debates sobre comunicação para participar do I Fórum Mundial da Informação e da Comunicação. Promovido pela agência alternativa de notícias IPS (International Press Service) e pela Novib, organização que representa a Oxfam International na Holanda, o evento, apesar de não fazer parte da programação oficial do FSM, revela que a comunicação entrou definitivamente na pauta dos movimentos sociais.
Planejado para preparar os jornalistas que cobrem o FSM, parte substancial do encontro foi reservada aos debates sobre a luta pela democratização das comunicações. Durante os painéis, foram abordadas questões como a concentração dos meios, censura e liberdade de expressão, mídia alternativa, formação profissional e propriedade intelectual.
Mercantilização da informação “Precisamos buscar a melhor forma para tratar essas questões. Apesar do crescente interesse pelo tema, ainda não aprofundamos coletivamente a reflexão sobre o processo que vem ocorrendo nas últimas décadas”. As palavras de Seán Ó Siochrú, coordenador da Campanha CRIS (Communication Rights in the Information Society), articulação internacional que busca interferir nos rumos da Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (CMSI), revelam uma preocupação compartilhada por outros grupos que lutam pela democratização da comunicação .
“Todas as dificuldades que enfrentamos atualmente são ao mesmo tempo sintoma e resultado do fato da informação ser, cada vez mais, uma das mercadorias mais valiosas do mundo. Não é à toa que as cifras das fusões das corporações de comunicação são tão grandes. Se são mercadoria, a lógica que as rege é, simplismente, a capitalista. Por isso, nossa tarefa é a de desmercantilizar a informação e transformá-la em um bem público”, defendeu Ignacio Ramonet, presidente do Media Watch Global e membro do Conselho Internacional do FSM.
Para controlar o fluxo dessas mercadorias simbólicas e imateriais, os grupos capitalistas apelam para o aumento da rigidez das regras nacionais e internacionais que protegem a propriedade intelectual. “Através de mecanismos que não permitem a circulação do conhecimento produzido pela sociedade, os grandes conglomerados de mídia estão conseguindo, pelo menos por enquanto, manter o domínio daquilo que quase todo o mundo vê, ouve e lê”, afirmou Ó Siochrú. Ele também atentou para a necessidade de que os movimentos pela democratização dos meios reconheçam a comunicação como um direito humano, indissociável dos outros direitos fundamentais.
Atualmente, tanto na OMC (Organização Mundial de Comércio) como na Ompi (Organização Mundial de Propriedade Intelectual), os governos dos países ricos, em especial o dos Estados Unidos, pressionam as nações em desenvolvimento a assinar acordos que reforcem as dificuldades para que a população tenha acesso ao conhecimento sem o pagamento de royalties. “Não basta ter o controle dos meios, eles precisam ter também a garantia de que o conhecimento não seja apropriado pela sociedade. E assim segue o mundo dividido, atualmente entre os têm acesso à informação e os que não têm”, concluiu Ó Siochrú.
Uma aliança necessária Para o representante do Greenpeace no Brasil, Marcelo Furtado, é necessário mudar o enfoque da formação dos profissionais. “Há um grave problema na formação dos jornalistas, que atualmente é quase exclusivamente voltada para que os alunos possam atender às necessidades do mercado. Essa lógica, presente em todo o mundo, acaba por fortalecer os grandes conglomerados”.
Já para o jornalista italiano Giulietto Chiesa, o caminho para reforçar a luta passa pela construção de uma aliança entre os trabalhadores em comunicação e a sociedade civil. “É o único caminho para que o tema ganhe relevância e passe a fazer parte de uma pauta comum de todos aqueles que lutam pela superação das desigualdades econômicas e sociais em todos os continentes”.
Outro processo de construção Apesar de intitulado “1° Fórum Mundial da Informação e da Comunicação”, o evento não seguiu o mesmo caminho percorrido pelos demais fóruns temáticos e regionais. A iniciativa foi exclusiva das entidades organizadoras e não foi submetida à aprovação do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial.
“Essa foi uma atividade autogestionada, proposta por essas duas entidades, sem nenhuma institucionalidade”, afirmou Antonio Martins, membro da Attac e do Conselho Internacional do FSM. Para Martins, entretanto, este fato não desmerece a iniciativa. “Foi mais um evento sobre o tema. Quanto mais falarmos sobre isso, melhor”.
O diretor geral do IPS e moderador do evento, Mario Lubetkin, não vê problemas em chamar de “Fórum” uma atividade organizada exclusivamente por duas entidades. Lubetkin revela que a idéia de se nomear a atividade dessa maneira foi uma “provocação” com a intenção de “chamar mais atenção para o evento e assim promover a temática da Comunicação no FSM”. Segundo Lubetkin, “não fosse esse o nome da atividade, não haveria essa quantidade de pessoas presentes”.