Equador: Pela Diversidade e Pluralismo
No Equador, o racismo além de massivo é estrutural e suas expressões destorcem não só as relações individuais, como também as coletivas, é por isso que, atendendo a um convite da Confereração de Nações Indígenas do Equador ( CONAIE) e da Agencia Latinoamericana de Informação - (ALAI), representantes de centenas de organizações, povos, movimentos e entidades, realizaram em Quito, nos dias 28 a 30 de setemebro passados, o Fórum Nacional pela Diversidade e Pluralismo.
Deste evento resultou um amplo plano de ações e propostas, que o Comitê está levando a prática, relacionadas principalmente com um projeto de sociedade que, fundamentado na visão do pluralismo e diversidade, assentam as bases para a erradicação de todas as formas de discriminação que derivam do racismo, da xenofobia e da intolerância.
Com toda evidência, as conclusões firmaram que a superação destes males passa tanto pela adoção de políticas econômicas e sociais que apontem para um maior equilibrio, como pela promoção de comportamentos éticos individuais e coletivos baseados no reconhecimento das diversidades.
O movimento indígena, encabeçado pela CONAIE, que nos últimos dez anos vem aglutinando expressões, protestos e propostas altrernativas ao modelo vigente e que além de sustentar saídas viáveis para a plena vigência dos direitos para os povos discriminados, tais como o reconhecimento de suas terras e territórios e a expressão de sua cultura e cosmovisões, vem levantado sua voz contra a corrupção e apontado soluções globais para a crise do país.
Por sua parte, as organizações afro-equatoriana, fundamentaram no Fórum a importância de que o país adote uma legislação que sancione a discriminação racial. Pois embora a constituição do país garanta a não discriminação e reconheça os direitos coletivos, estes não só vem sendo ignorados historicamente, como as condições de vida vem se pauperizando pela aplicação forçada do modelo neoliberal.
A análise do impacto da xenofobia expressou duas vertentes: a relativa às condições de emigração, cada vez mais massiva, cujas consequentes deportações ferem os direitos humanos; e o regionalismo interno, com tons racistas que afeta as migrações locais. Mereceu atenção o rechaço ao Plano Colômbia que vulnerabiliza, principalmente, os povos indígenas e afro-equatorianos das áreas de fronteira, e aos que reinvidicam exílio provenientes do país vizinho.
A intolerância foi destacada no entorno da conjunção entre discriminação racial e a xenofobia com outras formas de discriminação: por gênero, orientação sexual, status sócioeconômico, filiação religiosa, entre outras, para formular um urgente chamamado para a aplicação do princípio constitucional que garante a não discriminação por todos esses motivos.
Ao concluir o Fórum, os/as participantes, vindos dos quatro cantos do país, fizeram um chamado para unir vozes e ações para pôr em marcha, aquí e agora, um projeto de país plurinacional, livre de discriminação para todos e todas.
A fim de encaminhar estas propostas, foi designado um comitê, cuja composição reflete o princípio da participação da diversidade e a pluralidade equatoriana e constitui uma mostra do afã de unir esforços e realizar um processo real e intenso no Equador para enfrentar a problemática que planteia a III "Conferência Mundial Contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e outras formas de Intolerância" ( ONU/Africa do Sul,2001).
As múltiplas caras do Racismo
" O racismo se institucionalizou como uma estratégia da classe dominante contra os pobres e as nacionalidades e culturas diferentes, para poder governar em função de seus interesses", é dessa forma que se expressam as distorções na aplicação da Constituição e da justiça; na educação centrada na promoção dos valores dominantes; nas práticas não participativas; nas minimização da cultura, a criação e a ciência autóctonas.
" O racismo é uma arma que mantém o sistema neoliberal, para expandir sua potência econômica em todo o mundo, por isso vem sendo aperfeiçoado e institucionalizado. Equador e América Latina vivem sob a colonização ideológica sob esses critérios. Uma manifestação atual é a vanglória do avanço científico do descobrimento do genoma humano, cujo fim encoberto é o de criar um protótipo de homem de qualidade e desprezar o resto de sociedades e culturas do mundo", assinalaram.
O processo de globalização está tramado sobre bases racistas e discriminatórias, pois os grandes países e cooporações estão dividindo entre si os espaços geopolíticos do mundo, argumentando que são os únicos capazes de salvar o mundo e desenvolve-lo.
As consequências desta hegemonia, tais como a exclusão social, são apresentadas como um fato inevitável que os povos do Sul e especialmente os setores discriminados deveríam aceitar como uma fatalidade.
Mesmo assim, nos processos de "reordenamento" político interno, impulsionados pelo Equador, sob o pretexto da modernização do Estado, promovem uma idéia de religamento dos setores discriminados no âmbito local, setorial ou específico. As grandes decisões econômicas, legais ou políticas são atribuídas a técnicos ou especialistas das elites. Ainda no âmbito do local, vêm se expressando normas e decretos municipais com cores racistas.
Os limites impostos à participação democrática nas atividades e decisões econômicas e políticas, como também a marginalização das propostas e ações políticas das organizações, são expressões de racismo e, como complemento, relega mulheres, jovens e quem não tem poder.
Uma constituição boa, mas com práticas ruíns
O Equandor conseguiu, graças ao encaminhamento de propostas do movimento indígena e outros, incluir em sua Constituição os mais avançados princípios não discriminatórios. No entanto, pouco foi feito para dotar a cidadania de mecanismos para aplicar-los, é assim que as práticas sociais, cheias de comportamentos racistas, se mantém na impunidade .
Entre os exemplos assinalados, se evidenciou que até hoje existem lugares públicos que restringem o ingresso de indígenas e afro-equatorianos; escolas que obrigam cortar o tradicional cabelo comprido dos meninos indígenas e que impedem o uso da vestimenta autóctona: locais de trabalho, habitação e lugares públicos vedados aos afroe-quatorianos/as.
Por isso, surge como necessidades de primeira ordem a de educar o país com um enfoque transcultural orientado para a convivência pacífica e o reconhecimento das diversidades, quer dizer, construir um país que lute pela interculturalidade para melhorar a qualidade de vida de todos e todas.
Foi destacado o papel social dos meios de comunicação, chamados à promover uma visão de igualdade, oposta à "difusão explícita do racismo", que muitos deles refletem tanto ao atender com prioridade as perspectivas dos setores dominantes, como ao apresentar uma imagem distorcida dos povos e setores discriminados, de suas reinvidicações e propostas.
Transformar o mundo a partir de cada um
Em um debate franco, se analisou no Fórum o endoracismo, a supervalorização do urbano em detrimento do rural, a discriminação ideológica e o racismo internalizado que distorcionam as relações interculturais e minimizam a riqueza das expressões sincréticas , cuja virtude é unir o conjunto no reconhecimento de uma multiplicidade de manifestações criativas.
Se apontou, inclusive, as expressões de racismo e discriminação que se evidenciam ao valorizar até as formas organizativas, apontando com critérios negativos aquelas que derivam de culturas que não são dominantes ou da moda.
Isso permitiu visualizar que a erradicação do racismo possui multiplas faces e corresponde a todos e a todas levantar ações concretas para erradica-lo. E, para isso, disseram, identificar o problema é o primeiro passo.
A xenofobia, uma palavra nova para velhos fatos
" A palabra é nova, porém os fatos são velhos". De fato, o termo que geralmente está relcionado com " o ódio aos estrangeiros", no Equador está matizado pela acolhida favorável a quem vem do Norte e a atitude discriminatória para as migrações de setores e comunidades indígenas e negras.
No entanto, as preocupações centrais giraram en torno dos percalços dos que migram daqui para o Norte e a xenofobia que lhes são infligida nesses países, como também as consequências locais desse fenômeno, dentre os quais se identificaram: o abandono de terras, a ruptura da estrutura familiar, a exploração econômica por parte dos intermediários, o tráfico de pessoas, a carência de documentação legal para sair do país, mortes, desaparecimento, detenções ilegais no caminho e as deportações.
Mesmo assim, se enfocaram as dificuldades que enfrentam as pessoas que emigram no interior do país; a desvalorização do rural e o regionalismo que geralmene afetam o país. Para resolver isso se propõe ao Estado que:
- Ofereça os serviços básicos de saúde, educação, emprego, moradia para evitar a emigração.
- Impulsione campanhas de recuperação da identidade dos migrantes.
- Que através das embaixadas proteja os direitos dos emigrantes em outros países;
- Adote medidas para garantir uma distribuição igualitária da riqueza;
- Que crie uma Comissão de Vigilância da situação dos migrantes;
- Que, conjuntamente com ACNUR, defenda o cumprimento dos convênios internacionais em matéria de Direitos Humanos.
- Que as organizações desenvolvam campanhas de recuperação da identidade dos migrantes e de uma forma geral, a valorização da filosofia andina; e que forme uma comissão de Vigilância ou uma Ouvidoria da cidadania sobre a situação dos migrantes.
A (In)tolerância
A tolerância se define como o respeito e a integridade da pessoa humana e a natureza, enquanto que a intolerância está ligada a distorção dos ditos valores humanos para privilegiar os interesses econômicos e da hegemonia de um só grupo. Nesse sentido, o sistema capitalista e neoliberal é excludente e intolerante desde sua própria definição de interesses.
A partir desses valores, urge o desenvolvimento de uma visão do ser humano que integre o sóciocultural e individual e aponte para erradicar as consequências da intolerância que se expressam, dentre outras, na desvalorização de algumas pessoas e a vulneralização de sua identidade.
Assim, com a intenção de promover um mundo igualitário, o Fórum planteou a necessidade de superar as seguintes formas de intolerância: entre as gerações; de gênero, por orientação sexual, por status socioeconômico; por filiação religiosa e outras, para isso sugerem:
- O fortalecimento das identidades plurais;
- A promoção e uma cultura do encontro, a partir da pessoa humana, principalmente através de processos interculturais:
- A adoção de políticias públicas que viabilizem o princípio constitucional do respeito a diversidade:
- Aproveitar os recursos que o país dispõe: a constituição equatoriana, como a segunda maior e mais diversa constituição do mundo; os processos organizativos dos grupos e movimentos sociais; a mobilização social - local, regional e nacional; o trabalho com os governos locais, para promover mudanças de atitudes frente às situações de intolerância.
- Promover a educação em valores, entendendo-se como valores aqueles com critérios éticos de diversidade e pluralismo.
- Propor um trabalho conjunto com os meios alternativos de comunicação para a promoção desses valores.
- Apoiar a campanha da Década por uma Cultura de Paz e Não Violência das Nações Unidas, assim como a campanha do Terceiro Decênio de Luta Contra o Racismo, a Xenofobia e outras formas de Intolerância.
O Combate ao Racismo com enfoque de Gênero
A conjunção entre a discriminação de gênero e a racista tem gerado uma das mais perigosas maquinarias opressivas, cujas consequências vêm se cristalizando, tanto na discriminação sistamáticas das mulheres como afiançando esteriótipos sexistas que afetam o conjunto.
Isto atinge de maneira especial as indígenas e afro-equatorianas, " que sofremnos todo tipo de discriminações, dupla, às vezes triplas, por ser mulher, pela etnia e pela orientação sexual. Os exteriótipos sexistas têm criado uma imagem que coisificam as mulheres negras como destinadas ao trabalho doméstico ou sexual".
" Nós mulheres indígenas estamos procurando obter um espaço de participação e tomada de decisões a nível nacional e internacional, buscando o reconhecimento de nossa contribuição no desenvolvimento, na cultura, na religião, nas llímguas, na ciência, participação e contribuição na definição do projeto político das nacionalidades e povos indígenas".
O Equador vem sendo renitente em aceitar as/os diferentes, mas já começam a romper estruturas caducas que impedem a inclusão das/os excluídas/os da sociedade, tal é o caso das pessoas discriminadas por sua orientação sexual, afetadas pelas construções de papéis de gênero esteriotipados, considerados por muitos como irremovíveis.
O racismo conceituado por suas vítimas ( sínteses das conclusões)
O racismo é um sistema ideológico-filosófico, anticientífico e não humano, pregado e praticado pelos grupos de poder econômico e político para justificar a discriminação e agressão colonialista, que se traduz nos esteriótipos de exclusão e xenofobia levando a anulação, negação e/ou a eliminação física ou simbólica de um grupo humano; no caso do Equador, contra as culturais indígenas e negras.
Essa ideiologia é manejada pelos grupos dominantes sobre os subordinados como uma estratégia política para a exclusão, dominação e reprodução do colonialismo. A democracia e o controle político atual estão minimizando, ignorando ou anulando as demais sociedades e culturas, que se
vêem em contraposição aos interesses destes grupos de poder.
O racismo também é conceituado como a agressão verbal, psicológica, política e econômica: é um sistema político e ideológico menejado e controlado através dos militares, da religião e dos meios de comunicação.
Ao não ser sujeito de uma legislação que o sancione, o racismo é crime impune. Sua banalização tem permitido sua reprosução sem limites, que abarca todas as esferas, além de ser infligido pelos dominantes, tem gerado práticas discriminatórias entre suas vítimas. Assim, no Equador se notam dois tipos de pratica:
O Endoracismo conceituado como a prática discriminatória entre as culturas e sociedades marginalizadas ou pobres, elas mesmas, vítimas do racismo, um exemplo é a expressão de racismo do negro para com o indio e vice-versa. Ainda se desenvolvem práticas de discriminação e diferenciação dentro do mesmo grupo social cultural, muitas vezes pautadas por motivos socioeconômicos. Ilustra essa situação a discriminação exercida " entre os próprios negros". Estas práticas també, são exercidas a partir de um grupo social ou cultural para outro, como é o exemplo equatoriano dos "mestiços" contra os índios e destes aos negros", o que é conceituado como endoracismo.
Agenda nacional para acabar com o Racismo
Lutar pela identidade de cada um dos grupos sociais, pelo direito a sermos diferentes e fazermos nos respeitar como tais, organizando-nos e sendo solidários entre as vítimas do racismo e todos os pobres e marginalizados social e economicamente.
Praticar a interculturalidade entre os e as mestiças,índios e negros, com base no conhecimento histórico e cultural de cada grupo. Tomar medidas concretas para freiar o endo e o etno racismo, criar pontes de união e solidariedade frente aos dominantes.
Fomentar o desenvolvimneto de uma nova construção social que, respeitando as diversas cosmovisões leve à relações igualitárias entre os gêneros.
Realizar campanhas mediáticas para promover o pluralismo e a diversidade e que deslegitimize o racismo, a xenofobia, o sexismo e a intolerãncia. Levantar ações concretas e de mobilização para desvirtuar a ideologia racista, promover os direitos humanos e fortalecer a autonomia dos discriminados.
Que os organismos internacionais, desejosos de otimizar seus recursos, os destinem aos meios alterntivos, especialmente para a aquisição de um canal de televisão alternativo, para empreender, desde aí, as campanhas de educação contra o racismo, a xenofobia e a intolerância.
Reformar a Constituição a partir da cosmovisão dos povos indígenas e incorporar normas para sancionar a discriminação racial, a xenofobia e a intolerância.
A formulação de uma lei que tipifique e penalize o delito de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância.
Criar espaços de Controladoria social para seguimento e garantia no combate ao racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância.
O Estado deve tomar medidas para equilibrar as relações de de poder existentes nas dinâmicas entre os gêneros, especialmente no relativo à liderança e participação política das mulheres.
Realizar ciclos de sensibilização e capacitação, formal e informal, para visualizar as consequências do racismo sobre o conjunto da sociedade e iniciar o envolvimento do conjunto para a sua erradicação.
Propor ao Estado uma reforma curricular que inclua a diversidade de culturas e cosmoviões, cuja aplicação inclua enfoques multidisciplinares que dê visibilidade as diferentes propostas culturais e de identidade dos povos e nacionalidades.
Que a discriminação racial, xenofobia e intolerância relacionadas sejam incorporadas como eixos transversais nos conteúdos de estudos em todos os sistemas e subsistemas educativos. Isso com o fim de promover a descolonização mental/intelectual na educação pública e privada.
Fomentar as autonomias, a pluralidade e pluriculturalidade e fortalecer as organizações por nacionalidade e povo, e dentro destes.
Realizar ações para fortalecer a liderança e exercer o poder nos governos locais para retomar elementos e conhecimentos ancestrais, na busca de um novo modelo administrativo e econômico baseado na história e na nova realidade social entre diferentes culturas.
Que sejam criadas instâncias e mecanismo de participação dos povos indígenas, afro-equetoerianos, de jovens, mulheres em todos as esferas de poder e tomada de decisões na sociedade.
Que sejam adotadas políticas econômicas justas e planos de desenvolvimento para os povos e setores discriminados.
Proposta para a Conferência Mundial
Realizar uma campanha de luta a nível nacional e internacional para que o racismo seja penalizado e incluído nas respectivas constituições e legislações.
Qua a comunidade internacional adote medidas para sancionar o racismo, a xenofobia e a intolerância como crimes de lesa humanidade.
Qua a carta de propostas que o Estado equatoriano deve encaminhar à Conferência contra o Racismo, a Xenofobia , a Discriminação Racial e a Intolerância, leve em conta os avanços registrados em instrumentos internacionais anteriores: CDAW, Conferência de Beijing e Cairo, entre outras.
Qua a ONU promova a multiculturalidade e inclua em todas as suas instâncias a participação da juventude.
Qu o Comitê de Vigilância sobre o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância faça um seguimento pertinente em cada país sobre denúncias de racismo e aplique as sanções correspondentes pela não entrega pontual dos ditos informes.
Pôr em vigência o Convênio 169 da OIT referente a participação proporcional nas instâncias do Estado.