Pesquisadorem pedem anulação da liberação de milho geneticamente modificado

2007-07-24 00:00:00

Um grupo de 37 pesquisadores e professores universitários de diferentes áreas enviou nesta manhã (24/07) uma carta à ministra da Casa Civil, Dilma Roussef solicitando que seja revogada a decisão da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTN Bio) de liberar o milho transgênico \"Liberty Link\".

Os pesquisadores alegam que “a autorização dada à Bayer para comercializar milho transgênico careceu de qualquer rigor científico pois não se exigiu que a empresa realizasse estudo de impacto ambiental para os diversos ecossistemas do país, como seria de se esperar em se tratando da introdução de um transgênico que pode ter largo impacto sobre o meio ambiente e a economia do país” .

Os professores ainda alertam que “a CTNBio não deveria ter autorizado a sua liberação comercial sem antes ter discutido e aprovado uma política de coexistência com os outros sistemas convencional e agroecológico. Sem tal política, os milhões de agricultores brasileiros que poderão ser prejudicados ao terem seus cultivos contaminados, não saberão a quem recorrer para defender os seus direitos e obter reparação por danos materiais. Também o direito do consumidor a recusar alimento transgênico poderá ser ferido em sua essência, caso não haja efetiva proteção de cultivos orgânicos e convencionais contra contaminação por cultivos transgênicos não só durante a fase de plantio, mas também durante todo o processo de colheita, transporte e comercialização.”

Assinam a carta, entre outros, nomes como Fabio Konder Comparato, Luiz Menna Barreto, Bernardo Mançano, Laymert Garcia dos Santos, Juliana Bernardi Ogliar e Luiz Carlos Pinheiro Machado Filho.

Leia abaixo a Carta na íntegra.

24 de julho de 2007.

Excelentíssima Senhora

Dilma Roussef

Ministra da Casa Civil

Senhora Ministra,

Os abaixo assinados, professores universitários, pesquisadores e cientistas em diferentes áreas do saber vêm solicitar que Vossa Excelência convoque reunião do CNBS (Conselho Nacional de Biossegurança), conforme estabelece o artigo 8º, §1º, inciso III e art.9º, §1º da Lei de Biossegurança (11.105/2005) para rever a decisão da CTNBio de autorizar o plantio comercial do milho transgênico da Bayer, adotada no dia 16 de maio deste ano, pelas seguintes razões:

1. A autorização para o plantio comercial do milho Liberty Link, da Bayer, foi extemporânea, pois a CTNBio sequer concluiu a discussão sobre a instrução normativa que deveria definir a metodologia, critérios e procedimentos necessários para autorizações de transgênicos. Isso significa dizer que ainda não se têm parâmetros consensualmente acordados para estabelecer um debate científico sobre as solicitações de liberação comercial a serem examinadas e que o debate que se assistiu sobre o milho da Bayer naquela comissão foi cientificamente pobre e caótico do ponto de vista metodológico.

2. A autorização dada a Bayer para comercializar milho transgênico careceu de qualquer rigor científico pois não se exigiu que a empresa realizasse estudo de impacto ambiental para os diversos ecossistemas do país, como seria de se esperar em se tratando da introdução de um transgênico que pode ter largo impacto sobre o meio ambiente e a economia do país. Um dos conselheiros mais entusiastas chegou a declarar que tal tipo de estudo só se poderia fazer a posteriori. Isso significa dizer que a CTNBio desrespeitou o artigo 255 da Constituição Brasileira que impõe ao Poder Público o dever de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado para as futuras gerações, ignorando deliberadamente o Princípio da Precaução, princípio norteador da Lei de Biossegurança que deveria reger sua atuação, e assim transformando o país em laboratório da Bayer e a nossa população, em suas cobaias.

3. A CTNBio furtou-se a debater com aqueles setores da comunidade científica e da sociedade brasileira que se opunham a uma liberação irresponsável e apressada do milho transgênico, tendo primeiro se recusado a realizar Audiência Pública e, mais tarde, quando forçada a realizar audiência em virtude de liminar concedida pela Justiça Federal, organizado-a de modo a cercear a livre expressão de movimentos sociais e cientistas independentes que aí compareceram com o intuito de apresentar as suas preocupações. Não satisfeita em ter impedido a manifestação destes últimos, a CTNBio não incluiu no dossiê da Audiência Pública as críticas e questões levantadas pelos poucos oradores que dela obtiveram permissão para manifestar-se, tampouco tendo nomeado relator para responder a essas críticas, conforme exige, no entanto, o decreto que regula o seu funcionamento.

4. Uma vez que o milho é planta de polinização cruzada, a CTNBio não deveria ter autorizado a sua liberação comercial sem antes ter discutido e aprovado uma política de coexistência com os outros sistemas convencional e agroecológico. Sem tal política, os milhões de agricultores brasileiros que poderão ser prejudicados ao terem seus cultivos contaminados, não saberão a quem recorrer para defender os seus direitos e obter reparação por danos materiais. Também o direito do consumidor a recusar alimento transgênico poderá ser ferido em sua essência, caso não haja efetiva proteção de cultivos orgânicos e convencionais contra contaminação por cultivos transgênicos não só durante a fase de plantio, mas também durante todo o processo de colheita, transporte e comercialização. Tanto esta questão é óbvia, que a juíza Pepita Durski Tramotini Mazini, da Vara Ambiental de Curitiba, atendendo à solicitação da Terra dos Direitos, IDEC - Instituto de Defesa do Consumidor, ASPTA - Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa e ANPA - Associação Nacional de Pequenos Agricultores - no dia 28 de julho último suspendeu a decisão técnica da CTNBio referente à liberação do milho Liberty Link da Bayer até que sejam elaboradas as normas de coexistência das variedades orgânicas, ecológicas e convencionais com as variedades transgênicas e até que sejam definidos os termos do monitoramento do milho. A liminar estende seus efeitos sobre outras liberações comerciais de variedades de milhos transgênicos que estejam previstas para votação em próximas reuniões da CTNBio. Devido às implicações socioeconômicas destas regras de coexistência, sua elaboração a nosso ver extrapola as atribuições da CTNBio, devendo ser avocada por órgãos federais competentes como a ANVISA, o Ministério do Meio Ambiente e o Conselho Nacional de Biossegurança.

5. O milho é alimento de uso diário da população brasileira, também utilizado em larga escala na alimentação animal e em produtos industriais. A CTNBio considerou o milho da Bayer seguro para a alimentação humana e animal fiando-se apenas e somente nos argumentos oferecidos pela própria multinacional, não tendo mencionado ou conduzido testes para averiguar a sua inocuidade. Os argumentos da Bayer em prol do seu produto, ainda por cima, não se baseiam em testes de toxicologia ou alergenia, mas simplesmente em um controverso conceito de \"equivalência substancial\", que goza de duvidoso estatuto no seio da comunidade científica.

6. Como a Lei de Biossegurança determina que é da competência do CNBS analisar os impactos socioeconômicos, bem como a conveniência e oportunidade da liberação do milho transgênico, seria indispensável que o CNBS se reunisse para fazer tal análise, de modo a evitar grandes prejuízos para a agricultura do país e em particular para a agricultura familiar, comunidades tradicionais e povos indígenas.

7. A autorização para a liberação comercial do milho da Bayer neste quadro de indefinição de regras, procedimentos e responsabilidades pelos seus impactos ambientais e de saúde viola, a nosso ver, compromissos assumidos internacionalmente pelo Brasil, como é o caso da Declaração de Roma sobre a Segurança Alimentar Mundial, de 1996 e a Convenção das Nações Unidas sobre a Diversidade Biológica, de 1992,das quais o Brasil é signatário. Segundo o Artigo 8 g) desta última Convenção, os países membros deveriam criar ou manter meios para regular, administrar ou controlar os riscos associados ao uso e liberação de organismos vivos modificados que possam ter impactos ambientais adversos ou afetar a preservação e uso sustentável da diversidade biológica, aí incluíndo-se também os riscos à saúde humana. Em particular o Protocolo de Cartagena estabelece em seu artigo 23 sobre Conscientização e Participação do Público, que os países membros fomentarão e facilitarão a conscientização, educação e participação do público no processo de adoção de decisões em relação a organismos vivos modificados e, em seu artigo 26, sobre Considerações Socioeconômicas, alenta os países membros a cooperarem e investigarem os efeitos socioeconômicos destes organismos, particularmente para as comunidades indígenas e locais.

Por todas essas razões, consideramos imprescindível a convocação do órgão máximo de biossegurança do país, o CNBS, de modo a que este conselho possa rever o parecer técnico da CTNBio favorável à liberação do milho transgênico Liberty Link e analisar a conveniência socioeconômica de se permitir a liberação de milhos transgênicos no país.

Respeitosamente,

1. Drª Arline Sydneia Abel Arcuri - Pesquisadora Coordenação de Higiene do Trabalho, Divisão de agentes químicos . FUNDACENTRO

2. Drª Ana Amélia Silva - Profa. Assistente-Doutora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC-SP. Pesquisadora do NEAMP - Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política da PUC-SP; e, do CENEDIC - Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania - USP.

3. Dr. Antonio Bento Mancio - Professor Associado I. Universidade Federal de Viçosa

4. Dr. Bernardo Mançano Fernandes - Professor da Unesp

5. Dr. Carlos Frederico Marés - Professor da PUC/PR

6. Dr. Fabio Konder Comparato – Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

7. Drª Islene Ferreira Rosa

8. Drª Isabel Brasil- Bióloga, profa-pesquisadora da EPSJV/Fiocruz e da FEBF/Uerj

9. Dr. Jean Mac Cole Tavares Santos - Faculdade de Educação – Universidade Federal da Paraíba.

10. Dr. João de Deus Medeiros. Professor Associado - Departamento de Botânica, Centro de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC.

11. Dr. Jorge Machado - Universidade de São Paulo

12. Dr. José Marcelo Rocha Aranha - Biólogo, mestre em Zoologia e Doutor em Ecologia - Professor na Universidade Federal do Paraná

13. Dr. José Milton Andriguetto Filho Coordenador do Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento - Universidade Federal do Paraná

14. Drª Juliana Bernardi Ogliari – Doutora em Genética e Melhoramento de Plantas – Professora da Universidade Federal de Santa Catarina

15. Dr. Laymert Garcia dos Santos - Professor Titular do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp

16. Dr. Leonardo Galli . Mestre em Fitomelhoramento e Doutor em Produção Vegetal.

17. Drª Lia Giraldo - Fiocruz

18. Dr. Lúcio Flávio Rodrigues de Almeida - Departamento de Política da PUC-SP

19. Prof. Dr. Luiz Carlos Pinheiro Machado Filho

20. Dr. Prof. Luiz Menna – Departamento de Fisiologia e Biofísica da Universidade de São Paulo.

21. Dr. Luiz Gonzaga Falcão Vasconcellos – Instituto de Geografia - Universidade Federal de Uberlândia

22. Dr. Luís Amilton Foerster Professor Titular, Depto. de Zoologia, UFPR

23. Dr. Luiz Antonio Norder - Universidade Estadual de Londrina

24. Dra. Márcia Brandão Carneiro Leão - graduada, mestre e doutora em Direito Internacional pela USP

25. Dr. Marcio Chimelli - Departamento de Farmácia da UFPR

26. Dr. Marcos Arruda - Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul, Rio de Janeiro, e Instituto Transnacional, Amsterdam.

27. Dr. Marcus Levy Albino Bencostta - Professor Associado I - Universidade Federal do Paraná Pesquisador do CNPq

28. Drª Marijane Vieira Lisboa - PUC/SP - Relatora Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente

29. Dr. Marcelo Maisonette Duarte Chefe da Seção de Conservação e Manejo Museu de Ciências Naturais/ Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul

30. Dr. Marcelo Firpo Porto - Pesquisador Titular na Área de Saúde Ambiental -Escola Nacional de Saúde Pública/Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/FIOCRUZ)

31. Dr. Nagib Nassar - Professor da Universidade de Brasília - Phd em Genética

32. Dr. Oriowaldo Queda - Prof. Titular Aposentado, Departamento de Economia, Administração e Sociologia, ESALQ/USP

33. Dr. Paulo Roberto Antunes Aranha - Dept. Geologia - IGC/UFMG

34. Dr. Paulo Roberto Martins - IPT - Rede Renanosoma

35. Regina H V Petti - Instituto de Economia Agrícola (IEA) - Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA)

36. Dra. Uiara Bandineli Montedo - Engenheira Agrônoma, Doutora em Engenharia de Produção, Professora da Escola Politécnica da USP

37. Dr. Sérgio Sauer - professor da Universidade Católica de Brasília (UCB)

38. Dr. Yves Lesbaupin - ESS/URFJ

Para saber mais sobre a aprovação do milho transgênico: Gabriel - ASPTA - 21 8124 0095 Maria Rita - Terra de Direitos - 41 3232-4660