Sobre as dívidas agrícolas dos pequenos agricultores
Carta aberta do MPA ao presidente Lula
Exmo. Senhor Presidente da Republica
Luiz Inácio Lula da Silva
SENHOR PRESIDENTE!
O Senhor vem ao Rio Grande do Sul no dia 14 de agosto para lançar o PAC. Queremos dizer-lhe que apesar de grandes esforços, mobilizações e negociações de nossa parte, o grave problema do endividamento dos pequenos agricultores não foi resolvido. Nosso povo está em desespero enfrentando o terrorismo dos bancos e algumas cooperativas de crédito cobrando dívidas e os agricultores sem condições de pagar o conjunto destas dívidas.
Estas dívidas, Senhor Presidente, não têm causa em seu governo. Pelo contrário, seu governo começou a criar alguns mecanismos de proteção da produção e da renda que começam a dar resultados positivos na melhoria das condições de vida dos pequenos agricultores. Mas os resultados não são imediatos e os mecanismos ainda estão em fase de implementação (seguro agrícola, PGPAF, PAA/CONAB, biocombustíveis, habitação), com recursos ainda insuficientes, com vários aspectos a serem aperfeiçoados. Mas as dívidas que são fruto de 20 anos de empobrecimento, secas, juros altos, custos altos, preços baixos, falta de comercialização, batem na porta hoje, deixando os agricultores desesperados e sem dormir. E isto precisa solução já, com reprogramação, alongamento, rebates, refinanciamentos, equalizações e outros meios ao alcance do governo.
Nunca pregamos calote. Queremos pagar e temos como pagar parte destas dívidas. Não temos como pagar tudo, mesmo que queiramos. Grande parte desta dívida é com o setor privado, com cooperativas de crédito e crédito bancário com juros muito altos, que só tem nos estrangulado ao longo dos anos. Algumas Cooperativas de Crédito e alguns gerentes de Bancos emprestam \"papagaios\", CACs, cheque especial, etc, para pagar algumas dívidas, criando outra muito pior. Trocam uma dívida pela outra sem resolver o problema do agricultor, piorando ainda mais. Fazem mata-mata, resolvem momentaneamente o problema do banco ou da cooperativa de crédito, mas no futuro o problema será maior. Só para dar um exemplo: o custo de produção de 01 hectare de milho custa R$ 1.261,00 e o Pronaf Custeio financia em torno de R$ 450,00 por hectare. O restante o pequeno agricultor financia no setor privado, a juros muito mais altos (entre 4% e 8% ao mês) e esta é a causa real do endividamento não resolvido que se acumulou ao longo dos últimos anos.
Mas agora não temos mais como rolar e empurrar com a barriga. O modelo agrícola herdado dos governos anteriores quebrou. O fumo e a soja, símbolos deste modelo, são o exemplo mais claro, que é onde a crise dos pequenos agricultores é mais grave, embora as 08 multinacionais que atuam nos dois setores acumulam lucros fabulosos todos os anos e dizem que tudo vai muito bem. Os custos de produção, no modelo tecnológico vigente, são muito altos e os preços não remuneram neste custo.
Por isto Senhor Presidente, queremos solução para nosso problema. Apelamos para o senhor porque na mesa das negociações, não temos conseguido avanços para resolver de fato o problema. De modo especial, o Ministério da Fazenda tem se mostrado intransigente e sem a mínima capacidade de entender o problema social e histórico dos pequenos agricultores, que heroicamente sobrevivem no campo, recusando-se a engrossar as periferias urbanas. Depositamos todas as nossas esperanças na sua pessoa, que conhece nosso mundo, e na sua Autoridade, concedida pelo povo através do voto democrático. Muitas vezes sentimos vergonha e raiva vendo em nossa frente alguns que negociam conosco em seu nome e expressam preconceitos e posições que sabemos que não são vossas.
Não queremos desgastá-lo, nem lhe criar problemas. Mas se houver desgaste, a culpa é da intransigência do Ministério da Fazenda. Queremos apenas condições para produzir e pagar nossas dívidas. Mas se o nosso problema não estiver resolvido até o dia 09 de agosto, que é a próxima das muitas reuniões que já tivemos em Brasília, no dia 13 estaremos mobilizados em todo o estado do Rio Grande do Sul. Caso contrário, o Sr. não lançará apenas o PAC no RS, mas também o PQA: Programa de Quebradeira dos Agricultores.
Apresentamos propostas viáveis para encontrar caminhos de solução. Há boas propostas que apontam caminhos importantes para o futuro, como a municipalização da merenda escolar, projetos de produção de alimento e energia, programas de garantia de comercialização e preços, sistemas agroflorestais, programas de educação-capacitação-assitencia técnica e outros. Mas o endividamento acumulado precisa ser resolvido e o Ministério da Fazenda tem se negado a fazê-lo e, pior que isto, tem usado argumentos que tem como objetivo nos humilhar enquanto camponeses. Não aceitamos nem os argumentos e nem as atitudes do Ministério da Fazenda.
Por isto, Senhor Presidente, quando Vossa Excelência chegar ao Rio Grande do Sul, caso os problemas dos pequenos agricultores não sejam resolvidos, não vai nos encontrar em casa. Vamos estar nas ruas. E se o objetivo do Ministério da Fazenda é quebrar os pequenos agricultores, o que nossas bases estão dizendo é que não só eles estarão quebrados nesta hora. Outras coisas serão quebradas. Nossas lideranças preferem processos e cadeia a verem a quebradeira geral dos pequenos agricultores sem luta e sem indignação.
Preferimos, porém, encontrá-lo com festas e inaugurações, olhando para frente e para um futuro melhor. Temos certeza que será este o cenário que Vossa Excelência vai nos propiciar nos próximos dias.
DIREÇÃO ESTADUAL DO MPA – RS
SANTA CRUZ DO SUL, 02 DE AGOSTO DE 2007.