Reforma Agrária, só com a derrubada do Estado burguês

2007-06-14 00:00:00

Manter alianças com partidos historicamente de direita em nome da governabilidade. Indicar quem esteve sempre ao lado do capital financeiro para administração do Banco Central do País. Aprovar o cultivo de transgênicos, apoiar o agronegócio, implementar reformas que tiram ou reduzem direitos trabalhistas e previdenciários. Ficar ao lado dos usineiros e até de interesses do governo Bush. O que cada um faria, caso o governo que elegeu adotasse tais políticas? O questionamento foi lançado a milhares de Sem Terra, no ginásio Nilson Nelson, na tarde desta terça-feira, segundo dia do Congresso Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em Brasília.

Durante o painel "Conjuntura Política no Brasil", o dirigente nacional do MST, Gilmar Mauro, fez a pergunta, antecipando uma análise do atual governo. Lembrou da meta inicial de 500 mil famílias assentadas. E do que realmente foi implementado, com apenas 85 mil famílias (menos de um quinto da meta) assentadas nos primeiros quatro anos de gestão. Disse do pagamento dos altos juros para a aprovação do capital financeiro, em detrimento aos investimentos sociais.

Na arquibancada, o agricultor Domingos dos Santos anotava com atenção as idéias no caderninho. "A gente elegeu um governo, mas ele deu continuidade ao grupo dos bancos, fortaleceu os capitalistas", analisou. Aos 50 anos, Domingos é estudante de um curso técnico em Saúde, no município de Vitória da Conquista (BA). Diz que terminou o primeiro grau e parou de estudar. "O movimento me deu a condição de voltar", conta da própria revolução pessoal. Agora, quer trabalhar prevenindo doenças nas comunidades. E fazer parte de uma outra revolução, ainda maior.

A resposta ao questionamento, Gilmar jogou para cada um dos presentes. Ao mesmo tempo, alertou para o risco de se alimentar falsas expectativas e da necessidade de reação coletiva para qualquer mudança. "Não tenhamos ilusões com nenhum Estado burguês. O que a gente precisa não vai vir de cima para baixo. Ou se luta, ou nada", reforçou.

O chamado à ação veio com a crítica ao modo de produção capitalista, com conseqüências danosas para a classe trabalhadora, natureza e sociedade. Para Gilmar, a verdadeira Reforma Agrária só é possível com a "derrubada do Estado burguês". No caminho, defendeu alianças com todas as organizações da classe trabalhadora e o fortalecimento das lutas internacionais. Os exemplos são do presente, como na resistência dos iraquianos, numa derrota gradativa aos Estados Unidos. Resistência em Chiapas (México), que se espalha na Venezuela, é vista entre os palestinos e faz parte da história cubana. Dessa disposição, Gilmar convida para o movimento seguir em frente: "É necessário lutar, é possível vencer!". "Chega arrepia uma fala dessas", comenta o cearense Márcio Ferreira.

Márcio chegou antes das palestras da tarde, que teve ainda como convidadas a socióloga argentina Isabel Rauber, e a representante da Marcha Mundial das Mulheres, Nalu Farias. Na mistura de sons regionais, que embalaram a entrada dos participantes. Viu a menina anunciada no palco, aluna da escola itinerante do MST, que não deixa as crianças longe das aulas durante o congresso. Ela estava com "necessidade de encontrar a mãe" após o almoço. Para Márcio e os outros milhares, a formação se dava também nas músicas de abertura da tarde, na performance poética de abertura dos trabalhos, nas palavras de ordem dos estados, desde a pequena e atuante delegação de Roraima, com menos de 50 integrantes, aos centenas do Paraná. Na alegria do grupo ele também se sentia parte de um processo, para ser revolucionário. "É com essa disposição que seguiremos em frente", concluiu Gilmar.