Alguns anos de luta e Marcha da Consciência Negra em São Paulo

Gevanilda Santos
2014-11-18 18:00:00

A Marcha da Consciência Negra já é um evento da cidade São Paulo e demarca que o mês de novembro entrou para calendário da cidade para falar o quanto a presença da cultura de matriz africana está enraizada na cidade. Assim Milton Santos, geografo da modernidade, ajudou a conceituar a Avenida Paulista num território negro da cidade de São Paulo porque a Marcha renasce anualmente, no mês de novembro, no melhor espaço da cidade e dá lugar aos manifestantes rememorarem a luta de Zumbi dos Palmares e Dandara por liberdade, justiça social, igualdade de direitos e cidadania. Até hoje foram 11 Marchas da Consciência Negra e ao longo do tempo esse fio da história foi construído por várias mãos, mentes e corações abertos e atentos ao protesto negro e sua luta por diretos e oportunidades.

 

1ª.  Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2003

 

A 1ª. Marcha da Consciência Negra surgiu a partir das resoluções do II Encontro Estadual de Entidades Negras de São Paulo. O encontro realizado na primavera de 2003, na cidade de Cajamar, reuniu organizações sociais, políticas e culturais abrigadas na Coordenação Nacional de Entidades Negras – CONEN. Entre outras resoluções o encontro deliberou uma importante proposta de ação política, a marcha com a finalidade de estimular o reconhecimento de Zumbi dos Palmares como herói nacional. A 1ª. Marcha da Consciência Negra saiu às ruas de São Paulo em 2003. Na quinta-feira, dia 20 de novembro, pela primeira vez, esse tipo de manifestação ocupou a Avenida Paulista para homenagear o líder negro Zumbi dos Palmares (1655-1695). Após ato político no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP) a manifestação saiu em passeata pelas ruas de São Paulo em direção a Assembleia Legislativa - SP, e, simbolicamente, entregou   a proposta do feriado do dia 20 de novembro aos deputados da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP).

 

A 2ª Marcha da Consciência Negra - 2004

 

A Marcha saiu as ruas da cidade no dia 20 de novembro de 2004, um sábado, pela primeira vez no cenário da cidade um feriado municipal para celebração do herói Zumbi dos Palmares e do dia da Consciência Negra.

 

A manifestação repetiu o feito do ano anterior ao reunir cerca de cinco mil pessoas no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP) da Avenida Paulista. Após discussão e consenso o trajeto da manifestação foi alterado. A passeata saiu da Avenida paulista e seguiu pela Avenida Consolação até o centro velho da cidade de São Paulo, a Praça Ramos de Azevedo. Nas escadarias do Teatro Municipal, palco histórico da fundação do Movimento Negro Unificado em 1978 encerrou as comemorações ao dia de Zumbi. Assim em 2004 o dia 20 de novembro entrou para o calendário dos feriados municipais.

 

Em 2005 a Marcha Nacional Zumbi + 10

 

No ano de 2005 não houve marcha local e muitos ativistas e organizações sociais foram para a Marcha Nacional Zumbi + 10, em Brasília, Distrito Federal. A primeira Marcha Zumbi dos Palmares – Contra o Racismo, Pela Igualdade e Vida foi realizada no ano de 1995 em Brasília e reuniu cerca de 30 mil pessoas para rememorar o Tricentenário da morte de Zumbi dos Palmares.  Dez anos mais tarde ocorreu em Brasília duas Marchas, uma no dia 16 e outra no dia 22 de Novembro de 2005, para relembrar a omissão do Estado Brasileiro diante da desigualdade, principalmente entre negros, brancos e indígenas, ainda bastante acentuada.

 

3ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2006

 

Em 2006 Marcha celebrou os trinta e cinco anos do Dia Nacional da Consciência Negra que desde 1971 passou a ser lembrado por iniciativa do Grupo Palmares de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

 

Na capital paulista cerca de 10 mil pessoas compareceram no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP) da Avenida Paulista de lá saíram em passeata até as escadarias do Teatro Municipal, palco histórico da fundação do Movimento Negro Unificado em 1978.  Curiosamente, nesse ano apareceu a ideia de modificar o nome da Marcha da Consciência Negra para “Parada Negra”, a exemplo na já tradicional Parada do Orgulho Gay na Cidade de São Paulo.  Essa ideia não foi a frente.

 

Cidadãos, personalidades e representantes das organizações civis do movimento negro e representantes dos sindicatos, igrejas, movimentos populares, organizações estudantis, de mulheres e da juventude, juntos, demonstram amadurecimento entorno de uma aliança antirracista.

 

4ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2007

 

Em 2007, terça feira, a cidade de São Paulo assistiu mais uma vez a uma grande manifestação popular concentrada no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP) na Avenida Paulista. Os manifestantes saíram as ruas de São Paulo rumo as escadarias do Teatro Municipal para relembrar a resistência e afirmar a luta política e resistência da população negra as adversidades sociais que vem atravessando os séculos, desde a morte de Zumbi dos Palmares até hoje.  Os protestos da 4ª. Marchas foram para a violência sofrida pela juventude negra. A participação internacional na 4ª. Marcha registrou a presença do representante do Comitê Prisioneiros de Consciência (P.O.C.C) nos Estados Unidos, Fred Hampton Jr, filho do ativista do Partido dos Panteras Negras, Fred Hampton, assassinado em 4 de dezembro de 1969. Hampton Jr. afirmou que mantêm vivo o legado deixado por seu pai: conscientização e empoderamento negro nos Estados Unidos e no mundo.

 

5ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2008

 

A manifestação saiu as ruas de São Paulo em 20 de novembro de 2008, uma quinta feira. Do vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP) na Avenida Paulista seguiu uma vez mais para as escadarias do Teatro Municipal, no cetro velho da cidade. A Marcha demarcou os “120 anos da Abolição da Escravatura”, considerada ainda inacabada. Foi a vez homenagear grandes personalidades que povoou a história do Brasil. Relembrou o centenário da morte de Machado de Assis; o centenário do nascimento de Cartola e de Solano Trindade. Chamou atenção de todos para o centenário da Umbanda no Brasil e pediu o fim da intolerância religiosa. Rememorar aspectos importantes da histórica do Brasil foi uma forma de sensibilizar as escolas públicas e privadas para implantar a Lei 10639/2003 e acelerar a formação antirracista dos educadores, elo importante na mudança do currículo e dos livros didáticos por uma escola sem qualquer tipo de discriminação.

 

6ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2009

 

Em 2009, sexta feira, a marcha sofreu uma mudança no seu trajeto.

 

A concentração não foi no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP) na Avenida Paulista e mudou para Largo do Paissandu, em frente à Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, e de lá os manifestantes seguiram pela Avenida são Joao, Praça da República, Avenida São Luiz até as escadarias do Teatro Municipal na Praça Ramos de Azevedo. Oliveira Silveira, carinhosamente chamado de o “Poeta da Consciência Negra” faleceu em janeiro desse ano foi o grande homenageado da 6ª. Marcha em reconhecimento a sua dedicação a valorização da negritude na história do Brasil.

 

7ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2010

 

No sábado, dia 20 de novembro de 2010, a 7ª. Marcha saiu do Largo do Paissandu ocupou novamente as ruas do centro velho de São Paulo. Nesse ano a marcha homenageou os 100 anos da história da Revolta da Chibata (1910-2010) e do seu líder, o do Almirante Negro, João Cândido. Esta é referência obrigatória para conhecer a história de luta dos trabalhadores brasileiros pela garantia dos seus direitos, em especial a população negra. Uma luta que marcou a vitória dos trabalhadores da Marinha brasileira no início da Republica (1910).

 

8ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2011

 

Em 2011 a Marcha voltou ao trajeto tradicional. No domingo, 20 de novembro a manifestação da consciência negra saiu do vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP) na Avenida Paulista e seguiu uma vez mais para as escadarias do Teatro Municipal, no centro velho da cidade.  Novos episódios e personagens da luta antirracista foram homenageados: - 20 anos da morte do Padre Batista; -300 anos da Igreja do Rosário dos Homens Pretos; -100 anos do nascimento de Nelson Cavaquinho.  

 

9ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2012

 

A Marcha saiu da Avenida Paulista no dia 20 de novembro de 2012, era terça feira de ferido municipal, e percorreu as ruas de São Paulo. Seguiu seu trajeto e não dispersou, mesmo sob uma forte chuva que desabou sobre a cidade e consegui chegar as escadarias do Teatro Municipal na Praça Ramos de Azevedo. Uma vez mais a manifestação chamou a atenção da sociedade para as dificuldades enfrentadas pela juventude negras nas periferias da cidade. O grande protestou foi para o elevado índice de assassinato de jovens negros e pobres na periferia paulistana e defendeu as cotas raciais no ensino superior. Presença importante das redes de familiares de vítimas diretas da violência, junto as organizações do movimento negro, das mulheres negras, dos movimentos sociais do campo e da cidade, os cursinhos comunitários, sindicatos, associações, saraus periféricos, posses de hip-hop, imprensa alternativa, representantes de vários   partidos políticos e inúmeras outras representativas da sociedade civil. Todos participantes organizados no Comitê de Luta Contra o Genocídio da Juventude Negra e Periferia de São Paulo. O clamor era e é por mais justiça, mais respeito e paz!

 

10ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo - 2013

 

Em 20 de novembro de 2013, uma quarta feira de feriado municipal, foi o tempo 10ª.Marcha da Consciência Negra. O tema “Por um Brasil sem racismo a juventude quer viver” contagiou os protestos de rua. A 10ª Marcha saiu do vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP), na Avenida Paulista e seguiu até a Praça da República, no centro da cidade.

 

11ª. Marcha da Consciência Negra em São Paulo acontecerá em 2014.

 

No dia 20 de novembro uma vez mais sairemos das nossas casas, das quebradas, das diferentes trilhas e encruzilhadas para nos encontrarmos na Marcha da Consciência Negra. Compareçam...

 

Gevanilda Santos é Mestre em Sociologia e Diretora da Soweto Organização Negra. Este artigo teve como fonte de pesquisa o caderno Marcha da Consciência Negra em São Paulo – 10 anos de luta por uma sociedade sem racismo – Projeto do Coletivo de Empresários e Empreendedores Afro-Brasileiro - CEABRA.